As Fadas da Natureza Morta - Sheila Guedes

Olá!

Faz tempo que não interajo por aqui e sinto de falta de vocês que me acompanham há tantos anos nas redes sociais. Com o tempo, quero voltar a compartilhar minhas impressões sobre livros, filmes, séries, poesias, como sempre fiz.

Para recomeçar, trago uma dica de leitura que me impressionou muito: o novo romance da Sheila Guedes.  Já conhecia a Sheila e seu trabalho em diversos gêneros — de romances de época a contemporâneos —, mas, em As Fadas da Natureza Morta, ela me surpreendeu e me fez ter ainda mais orgulho da nossa literatura. É incrível ver como o Brasil possui tantos talentos! E, melhor ainda, é primoroso ver o quanto a nossa literatura permanece viva e forte! Tenho um orgulho enorme disso.

Você já sentiu o peso de uma decisão que modificou sua vida e ainda te assombra?

Em As Fadas da Natureza Morta (e-book - 218 páginas; publicação independente), a protagonista Tereza é uma jovem humilde e dedicada do sertão paraibano, que ajuda a mãe e os irmãos (Samuel, Josias e Marcelo), já que o pai os abandonou à própria sorte. Em busca de seu sonho de fazer medicina, ela parte em silêncio, deixando para trás a família e os amigos, mas o passado traumático insiste em permanecer.

Nós somos todos frutos de uma vida miserável. Onde se disputava em cada migalha de amor e atenção.

Para sobreviver na cidade grande, ela tenta de todas as formas apagar sua história, sua identidade, a culpa e suas raízes. Mas o destino, com sua própria maneira de agir, a faz confrontar a perda de sua verdadeira identidade e refletir se vale a pena abandonar as próprias raízes em nome da sobrevivência.

Anos depois, quando descobre que um paciente, indigente, na verdade, é seu pai, e o perde na mesa de cirurgia, e ela tem que voltar para a sua terra, me veio uma emoção melancólica, como traduz exatamente a canção pungente "De Volta pro Aconchego", de Elba Ramalho, que traz sentimentos que tocam em nosso âmago.

"Estou de volta pro meu aconchego
Trazendo na mala bastante saudade
Querendo um sorriso sincero, um abraço
Para aliviar meu cansaço [...]

[...]
Parece que falta um pedaço de mim
[...]"

A capa do livro reflete com exatidão essa profundidade. De um lado, o lado sombrio dos dramas e traumas dos personagens. De outro, a beleza do cacto na terra árida, que me trouxe uma esperança: nunca devemos deixar de acreditar que dias melhores virão, mesmo em meio às dificuldades.

Esse romance me desestruturou com sua trama profunda e as vivências de uma família que sonhou em fugir da miséria diante de tanto sofrimento. Vi-me refletindo sobre as minhas próprias raízes e a criação que me moldou.

— Não precisa ter medo, fia. Finque suas raízes no solo da vida, que são elas que te sustentarão quando os ventos fortes tentarem te derrubar.

Sabe como é a imaginação das crianças? Pois é. "As Fadas" no título me trouxe uma simbologia lúdica que me remeteu à esperança de uma vida idealizada. Mas, como as circunstâncias nos moldam, a história nos mostra que nossos sonhos nos levam a caminhos que jamais ousaríamos trilhar. O livro também é sobre esperança e resistência. Ele me trouxe tantas emoções e me fez lembrar de clássicos como "Vidas Secas" e "Grande Sertão: Veredas".

Quando eu era criança, nos períodos em que a chuva caía, mesmo que de forma tímida, eu costumava sair para procurar as fadas da natureza morta. Era assim que eu chamava. Eu acreditava em magia e vivia em busca dos seres mágicos que eram capazes de despertar as árvores do seu sono quase contínuo transformando um tronco acinzentado, de galhos secos e sem cor em algo vivo e exuberante. Na minha imaginação infantil, nada poderia explicar tal transformação, a não ser a magia das fadas.

Fiquei maravilhada com a autora por abordar mais sobre o nosso Brasil, de forma tão genuína, a vida sofrida, mas guerreira, do povo sertanejo. A história, repleta de coragem e esperança, em meio à lida diária, mostra o amor deles pela terra e suas origens. Além disso, a autora descreve de forma detalhista os ambientes, os lugares, a natureza, que torna tudo muito crível e visual, ainda mais para quem não conhece essa região do Nordeste. Fiquei com vontade de conhecer as plantas e os Lajedos mencionados.

Chorei em vários momentos e me emocionei com a profundidade do enredo por mostrar que a família é o nosso bem mais valoroso e que devemos priorizar o amor-próprio, além de nossas crenças e raízes. Quantas vezes nós nos sentimos saudosos de uma época e momentos simples que vivemos com nossos familiares, amigos, em que éramos felizes; momentos que não voltam mais, mas perduram em nossas lembranças.

Eu não sabia, mas agora eu sei: o que meu coração carecia esse tempo todo era de uma mão estendida em minha direção, pronta para me segurar quando eu precisasse de ajuda. Uma mão conhecida. Uma mão de alguém que sabe quem sou de verdade e, mesmo assim, não titubeou em estender a sua para me amparar, mesmo que eu tenha acreditado durante anos que jamais seria merecedora desse gesto novamente. 

Vi-me torcendo por todos os personagens até o final; enquanto uns me deram pena, indignação, outros me trouxeram um sorriso genuíno de alegria e conforto no coração, como foi o caso de Josias, um dos irmãos dela (que me fez ver um pouco de mim mesma), e de Gustavo, o seu primeiro e verdadeiro amor. Foi um livro inesquecível, daqueles que ficam em nossa memória para sempre.

As Fadas da Natureza Morta me ensinou uma grande lição: só se vive de verdade quando fazemos as pazes com quem somos. Quando aceitamos nossas imperfeições e mostramos nossa força, mas também nossa vulnerabilidade. Quando estendemos a mão para oferecer apoio e aprendemos a pedir abrigo quando precisamos.


AS FADAS DA NATUREZA MORTA é um mergulho lírico nas camadas da memória, da culpa e da identidade. Um romance sobre a brutalidade das escolhas, os afetos que sobrevivem e a estranha ternura de quem tenta reconstruir-se com as partes que restaram.

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